
Nos últimos anos, o poder dos torcedores, especialmente das torcidas organizadas, tem crescido significativamente no futebol brasileiro. A influência extrapola as arquibancadas e invade o âmago das decisões dos clubes, impactando contratações, políticas internas e até a gestão profissional.
Em times com grandes massas de torcedores, como Corinthians e Flamengo, essa voz tornou-se um elemento decisivo que clubes, dirigentes e jogadores precisam entender e administrar cuidadosamente.
FORÇA NAS ARQUIBANCADAS E ALÉM
O Flamengo, que em 2025 ultrapassou o Corinthians na liderança da média de público em estádios, é um exemplo claro da evolução do papel do torcedor no futebol.
Com uma média de 43,2 mil torcedores pagantes por partida, o Rubro-Negro do Rio de Janeiro demonstra como a mobilização popular reflete diretamente no clube.
O Corinthians, embora tenha mantido uma média de 42 mil pagantes, viu sua torcida também se posicionar com grande força diante de questões administrativas e esportivas, mostrando que a presença no estádio é apenas um dos modos de expressão dessa paixão.
ENGAJAMENTO
A maioria das decisões internas dos clubes, como a contratação de jogadores ou a troca de treinadores, já não é tomada apenas pelo alto escalão da diretoria.
Líderes das torcidas organizadas, que representam grupos altamente engajados e vocalmente atuantes nas redes sociais, influenciam e pressionam as direções para que atendam suas demandas. Segundo o líder da torcida organizada “Gaviões da Fiel”, Fernando Silva, “hoje nossa voz é ouvida não só na arquibancada, mas nas reuniões informais e redes sociais. Queremos participar das decisões porque sabemos o que a torcida espera”.
PRESSÕES NAS REDES SOCIAIS E MANIFESTAÇÕES
Além das manifestações durante os jogos, as torcidas têm utilizado intensamente as redes sociais para pressionar os clubes. Campanhas para reforços, críticas ou apoios a jogadores e técnicos, e até cobrança por mudanças na gestão são constantes.
Um representante do setor de marketing do Flamengo, comenta que “a interação direta da torcida com o clube nas mídias digitais é um fenômeno que transformou o futebol. Agora, temos que conciliar interesses comerciais com o sentimento da massa, para manter a lealdade e o engajamento”.
SÓCIO-TORCEDOR
Esse papel dos torcedores não é exclusivo do futebol brasileiro. Em outros países com ligas tradicionais, como Espanha, Itália e Inglaterra, a participação dos fãs nas decisões vem crescendo, especialmente com a adoção de modelos associativos e programas de sócio-torcedor.
No Brasil, o crescimento desses programas, como observado em uma tese qualitativa sobre o Flamengo, confirma a tendência de a torcida deixar de ser apenas espectadora para tornar-se um ator ativo no clube3.
IMPACTOS E DESAFIOS PARA A GESTÃO DOS CLUBES
Com o aumento desse poder da torcida organizada, os clubes enfrentam o desafio de equilibrar suas estratégias comerciais com as expectativas dos torcedores, que muitas vezes demandam posicionamentos imediatos e fortes.
O dirigente corintiano Marcelo Tavares afirma que “a gestão hoje é um jogo complexo. Atender interesses comerciais e patrocínios é vital, mas não podemos alienar a torcida, que é a alma do clube. Encontrar esse equilíbrio é um constante aprendizado”.
COMPARAÇÕES COM OUTRAS MODALIDADES E PAÍSES
Ainda que o futebol seja o esporte no Brasil mais influenciado pela voz organizada das torcidas, modalidades como o basquete e o vôlei têm estruturas muito menos vulneráveis a essa interferência popular. No entanto, nos Estados Unidos, ligas como a NBA possuem associações oficiais de fãs que dialogam institucionalmente com os clubes, dando voz às massas de maneira formalizada.
No Brasil, o potencial das torcidas organizadas para mobilizar grandes contingentes e suas campanhas nas redes sociais dão a elas um poder informal, mas impressionante.
Flamengo e Corinthians detêm as maiores torcidas do País, representando juntos quase 42% dos torcedores brasileiros. Essa base numerosa potencializa ainda mais sua capacidade de influenciar decisões estratégicas.
NOVA ERA PARA O FUTEBOL BRASILEIRO?
A atuação crescente das torcidas organizadas nas decisões interna dos clubes é um fenômeno que, se bem conduzido, pode fortalecer a relação clube-torcedor e levar a uma gestão mais transparente e alinhada com o sentimento da base.
Como destacou o especialista em comportamento do consumidor esportivo, Dr. Pedro Rodrigues, “essa aproximação pode ser positiva, com torcedores mais engajados e decisões mais alinhadas à paixão que move o futebol. Porém, se a pressão virar ingerência, os clubes podem sofrer, seja em estabilidade administrativa ou em resultados técnicos”.
LIMITES
Assim, o mercado do futebol brasileiro está diante de uma transformação onde a voz das torcidas organizadas não é mais secundária, mas fundamental para o planejamento e operação dos clubes.
Estar de portas abertas para o diálogo, mas estabelecer limites claros, parece ser o caminho para um futebol mais conectado, vibrante e sustentável.