De Lúcio a Fabrício Bruno: as dificuldades defensivas do Brasil

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Fabrício Bruno
Fabrício Bruno/Foto de Marcelo Cortes (CRF)

O futebol brasileiro sempre foi conhecido por revelar craques mais ofensivos: de Pelé a Neymar, a lista de grandes nomes é imensa. No entanto, se no ataque há talento de sobra, a situação é bem diferente no setor defensivo.

A recente derrota da Seleção Brasileira por 3 x 2 para o Japão, em amistoso disputado em Tóquio, reacendeu o alerta: o Brasil está sofrendo – e muito – para formar uma zaga de qualidade.

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A virada sofrida diante dos japoneses expôs fragilidades técnicas, posicionamento equivocado e uma desconexão preocupante entre os setores da equipe.

O primeiro gol japonês, inclusive, foi resultado de uma falha individual grosseira do zagueiro Fabrício Bruno, que entregou a bola nos pés do adversário dentro da área.

A falha, porém, é apenas o retrato mais visível de um problema mais profundo e estrutural: a escassez de defensores confiáveis e com alto nível técnico.

ONDE ESTÃO OS HERDEIROS DOS GRANDES ZAGUEIROS?

O Brasil tem tradição na zaga. Nomes por exemplo como Bellini, Mauro, Luiz Pereira, Oscar, Edinho, Aldair, Mauro Galvão, Ricardo Gomes, Lúcio, Juan, Thiago Silva e Miranda honraram a camisa da Seleção com atuações seguras, liderança e leitura de jogo apurada.

Esses atletas não apenas se destacaram em suas posições, mas também marcaram época em clubes do Brasil e da Europa. Lúcio foi campeão mundial em 2002 sendo protagonista; Aldair e Mauro Galvão marcaram história na Roma e no Vasco, respectivamente.

Thiago Silva, apesar de críticas em momentos decisivos, é tido por muitos como o melhor zagueiro brasileiro da última década e ainda apresenta futebol de alto nível no Fluminense mesmo com idade mais avançada.

Hoje, porém, poucos nomes se aproximam desse nível. É sintomático que a Seleção precise recorrer a zagueiros em má fase ou sem experiência internacional relevante.

A escassez é tão evidente que jogadores como Gabriel Magalhães e o próprio Fabrício Bruno, ainda em construção, se tornam titulares quase por falta de opções melhores.

SISTEMA DEFICIENTE

Os motivos para a atual deficiência defensiva vão além do acaso. Eles estão diretamente ligados à maneira como se forma o jogador brasileiro atualmente.

“O futebol de base no Brasil hoje prioriza o espetáculo, o drible, o gol. Poucos treinadores de categorias menores ensinam o valor do desarme limpo, da leitura de jogo, da cobertura correta”, analisa o comentarista Paulo Vinícius Coelho (PVC). “Zagueiro bom, hoje, vira volante. Volante bom, vira meia.”

Além disso, o calendário sufocante e a pressão por resultados impedem um trabalho mais aprofundado nos clubes. O foco está em revelar atacantes que possam ser vendidos rapidamente à Europa — e não em consolidar sistemas defensivos sólidos ou formar líderes de zaga.

O ex-zagueiro e técnico Antônio Carlos Zago também critica a formação atual: “A escola brasileira de zagueiros está desaparecendo. Falta orientação, mas também falta valorização. O garoto que é bom de bola quer ser atacante, porque sabe que o dinheiro e a fama vão vir mais rápido.”

DEFENSORES VERSÁTEIS: PEÇAS RARAS NO BRASIL

Outra consequência dessa mudança de foco é o desaparecimento de zagueiros versáteis. Jogadores como Juan, que saíam jogando com técnica refinada e sabiam se posicionar com inteligência, hoje são exceção. A nova geração, muitas vezes, ou é física demais e falha com a bola nos pés, ou tenta ser construtor sem ter base defensiva.

“O Brasil sempre teve zagueiros que sabiam jogar e marcar. Agora temos muitos que não sabem nem um, nem outro. E aí, quando enfrentamos seleções organizadas como o Japão, sofremos”, disparou o ex-técnico da Seleção Sub-20 Rogério Micale, responsável por comandar a equipe na conquista do ouro olímpico em 2016.

LUZ NO FIM DO TÚNEL?

Apesar do cenário preocupante, há promessas. Murilo, do Palmeiras, tem se destacado com regularidade. Beraldo, revelado pelo São Paulo e hoje no PSG, é outro nome observado com atenção.

No entanto, ainda é cedo para dizer se esses jogadores vão atingir o patamar de uma zaga verdadeiramente confiável para disputar uma Copa do Mundo.

PAPEL DA CBF

A Confederação Brasileira de Futebol (CBF), por sua vez, pouco tem feito para mudar esse cenário. A reformulação técnica anunciada após a eliminação precoce nas Eliminatórias Sul-Americanas ainda não produziu efeitos visíveis no setor defensivo.

Para reverter o quadro, será necessário mais do que boas promessas: é preciso repensar a formação dos defensores desde a base, investir em treinadores especializados na função e mudar a mentalidade de que “quem sabe jogar, joga na frente”.